De cabeça para baixo

Se as regras e funções da gestão forem viradas de cabeça para baixo, o que acontecerá com as grandes empresas?

Gary Hamel afirma que os desafios que os líderes empresariais do século XXI encaram são no mínimo tão intimidantes, empolgantes e inéditos como os que enfrentaram os pioneiros industriais do mundo há cem anos.

“Quem sairá por cima se as regras e funções da gestão forem viradas de cabeça para baixo?”, questiona o professor, explicando que obviamente, estamos vinculados a um precedente e a maioria de nós tem interesses pessoais no status quo da gestão. Mas, “se seres humanos puderam inventar a moderna organização industrial, então eles podem e devem reinventá-la”, assegura-se.

De acordo com Hamel, a inovação em gestão tende a produzir uma vantagem competitiva quando uma ou mais de três condições são atendidas. A inovação baseia-se em um princípio original de gestão que desafia alguma ortodoxia antiquada: a inovação é sistêmica, abrangendo uma gama de processos e métodos; e/ou a inovação é parte de um programa contínuo de invenção acelerada em que o progresso aumenta com o tempo.

Whirlpool – A título de exemplo, o guru cita o caso de Dave Whitwam, na época chairman da Whirlpool, que entendeu isso com muita clareza quando, em 1999, desafiou os colegas a fazer da inovação uma competência essencial.

Desde o início, Whitwam deixou claro que não queria um programa único, uma incubadora empresarial ou uma divisão de novos empreendimentos. Ele queria algo mais profundo e mais sistêmico. As mudanças não foram resultado de algum plano mestre extremamente detalhado. Ao contrário, elas surgiram no decorrer da “jornada” de inovação da Whirlpool, geralmente em resposta aos obstáculos que teriam sido difíceis de prever no início.

A recompensa? Em 2005, a Whirlpool obteve US$ 760 milhões de produtos que atenderam aos novos erigidos critérios de inovação da empresa, de uma receita total de US$ 14,3 bilhões, que foi de US$ 10 milhões em 2001.

O professor afirma que embora os esforços de inovação tenham sido amplamente divulgados, um concorrente encontraria dificuldade para reproduzir o que agora é um sistema de inovação firmemente implantado.

“Algumas informações fragmentadas sobre as práticas distintivas de gestão de um concorrente têm valor limitado quando se está tentando reproduzir a totalidade de um sistema diferenciado de gestão”, pontua.

Limitações – Hamel é adepto ao pensamento de que “nem toda inovação em gestão cria uma vantagem competitiva”. Isto porque algumas inovações são incrementais, outras são errôneas, e muitas nunca compensam. Naturalmente, pode-se dizer o mesmo de outros tipos de inovação.

A inovação em gestão obedece a uma lei de potência: para cada ideia verdadeiramente radical, que muda para sempre a prática de gestão, há dezenas de outras de menor valor e influência. Mas isso não é desculpa para não inovar. A inovação é sempre um jogo de números: quanto mais números você jogar, maiores as chances de ganhar um bom prêmio.

Além disso, nenhum grande avanço em gestão, por mais ousado ou bem executado que seja, pagará dividendos competitivos para sempre. Nos anais da inovação em gestão, há muitas empresas que já deixaram de lado o pensamento convencional, mas nunca repetiram a façanha. “Para inventar o futuro da gestão, é preciso mais do que fé intelectual no valor da inovação em gestão. Precisa de uma paixão por alguns desafios muito específicos e muito nobres”, sugere.

Ousadia - Se a inovação em gestão foi principalmente incremental nos últimos anos, isso talvez reflita falta de ousadia na escolha dos problemas a tacar. O professor aconselha a perguntar a si mesmo se a sua empresa já assumiu um desafio de gestão que fosse realmente sem precedentes, em que não se pudesse contar com a experiência de outra empresa como orientação.

A inovação geralmente é um processo interativo em que as soluções surgem à base da tentativa e erro. “Se você está preocupado em querer demais, não esqueça de duas coisas. Em primeiro lugar, nem sempre é necessário assumir grandes riscos para resolver grandes problemas.Em segundo lugar, se o problema for grande o bastante, qualquer espécie de progresso será valioso, mesmo que você nunca encontre uma ‘solução’”, recomenda.

Inventividade – Hamel afirma que é preciso inventividade, coragem e perseverança para solucionar grandes problemas. “Essas qualidades humanas são mais abundantes quando o problema a ser resolvido não é apenas importante, mas emocionante também”, avalia. Se você ainda não tem este desafio em mente, eis algumas perguntas capciosas que o ajudarão a enfocar em sua empresa:

- Quais são os novos desafios mais difíceis que o futuro reserva para sua empresa?

- Quais são as descontinuidades emergentes que levarão os processos e práticas atuais de gestão ao ponto de ruptura?

- Qual é o “problema futuro” no qual você gostaria de começar a trabalhar agora?

- Quais são os malabarismos difíceis que aparentemente sua empresa nunca consegue fazer?

- Há um trade-off crítico em que parece que um lado sempre prevalece em detrimento do outro?

-  Qual é o frustrante “e/ou” que você gostaria de transformar em “e”?
- Quais são os maiores descompassos entre retórica e realidade em sua empresa?

- Quais são os valores que ela tem maior dificuldade de se mostrar à altura ou acha mais difícil de institucionalizar?

- Qual é o valor adotado que você gostaria de transformar em uma capacidade integrada?

- Sobre o que você se sente indignado?

- Quais são as incompetências frustrantes que assolam sua empresa e outras como ela?

- O que a grande empresa “não pode fazer” que precisa passar a poder?

O professor enfatiza que tendo em mira este grande desafio, você precisará decompô-lo em componentes menores e mais manejáveis. Isso lhe permitirá focar suas energias em subproblemas de grande impacto e o ajudará a maximizar os retornos sobre os esforços de inovação. “Considerando que a tecnologia de gestão varia pouco de empresa para empresa, você descobrirá que a maioria das falhas com que precisa lidar é endêmica em todas as grandes organizações. Isso tornará o processo de diagnóstico mais fácil”, tranqüiliza Hamel. Muito já foi escrito sobre a razão das grandes empresas serem lentas para mudar ou como as burocracias sufocam novas idéias.

Segundo Hamel, o verdadeiro desafio não é diagnóstico, e sim terapêutico. “Sabemos bem por que grandes empresas são incompetentes em certas coisas, mas, apesar de uma montanha de recomendações e advertências, parece que poucas superaram essas insuficiências”, conclui. O que falta não é análise perspicaz, mas alternativas realmente arrojadas e criativas para o estado atual da gestão – e um exército de inovadores com vigor para reinventar a gestão de cima para baixo.

Portal HSM
De cabeça para baixo De cabeça para baixo Reviewed by Unknown on Monday, December 06, 2010 Rating: 5

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